"Mas como, então, se cumpririam as Escrituras, que dizem que assim deve acontecer?" Mt 27.54.
Jesus morreu porque as Escrituras previram ou as escrituras previram porque Jesus, de fato, cumpriria o que estava escrito?
Jesus fala a Pedro estas palavras após o apóstolo ter ferido a orelha do servo do sacerdote, ao ser preso no jardim do Getsêmani.
Podemos ver aqui, como em muitas outras falas de Mateus, a referência as Escrituras prevendo tal acontecimento. Podemos imaginar então um certo determinismo, ou seja, tudo vai acontecer porque está determinado que assim seja.
Não posso dizer sobre todos os demais casos. Teria de investigar um a um. No entanto, neste específico, onde Jesus diz: "como se cumpririam as Escrituras que dizem que assim deve acontecer?", não se trata de determinismo e sim de comprometimento.
Jesus conhecia as Escrituras. Ele sabia que ele era a pessoa a respeito de quem elas falavam. E o único, o exclusivo e único modo pelo qual os eleitos possam ser salvos é a morte do Messias.
Um pouco antes, Jesus diz ao mesmo Pedro que ele poderia rogar por livramento e isto seria imediatamente concedido. Todavia, Jesus não pede. E um pouco mais atrás, Jesus está tão angustiado, tão deprimido, a ponto de morrer. Segundo Lucas 22.44 a angústia era tão profunda que seu suor estavam misturado a sangue, devido a um fenômeno conhecido como hematidrose. Este fenômeno é especialmente raro. Somente um abatimento físico extraordinário motivado por grande pavor é capaz de causar a ruptura dos vaos capilares sob as glândulas sudoríparas, misturando sangue ao suor.
No jardim, Jesus lembra das Escrituras. Ele é o escolhido do Pai para aquela tarefa. Ele havia dito, na boca de Isaías: "eis-me aqui, envia-me a mim". E Jesus não desiste. Não volta a traz. Ele está comprometido. Ele prometeu. E ele não é "homem para mentir, nem filho do homem para que se arrependa".
Jesus olha para as Escrituras e sabe que se ele desiste, elas não se cumprirão. E esta seria uma realidade possível. Nunca saberemos qual rumo teria a criação, mas ela era uma possibilidade real.
A diferença é que esta realidade possível se desenvolveria com a desistência de Jesus, não cumprindo o contrato que ele assinou, o compromisso que ele assumiu.
Posso até pensar que seria legítimo. Quem de nós não pensaria em desistir de um contrato se ele se tornasse impagável? Aliás, no linguajar jurídico até se diz distrato, quando uma das partes quer refazer ou desistir. E isto é até legal.
Entretanto, Jesus não desistiu. Dentre muitos motivos, um deles é que isto desmoralizaria o Pai. Desacretitaria as Escrituras. E ele, Jesus, estava comprometido com a Trindade. Por isso ele segue em diante.
Jesus morre não porque simplesmente estava escrito. Estava escrito porque ele, Jesus, é fiel. O Pai escreveu porque sabia que podia confiar no Filho. Neste sentido, a pessoa de Jesus vem antes de sua própria escrita.
Como pequenos cristos devemos ter o mínimo de comprometimento. Seja o nosso sim, sim; nosso não, não.
Jamais chegaremos ao nível de Cristo, entretanto, devemos ter mais compromisso, muitas vezes com risco de prejuízo pessoal, com os acordos que firmamos.
Sejamos fiéis nos relacionamentos conjugais e familiares. Nas relações sociais no trabalho, na escola, na sociedade em geral.
Acima de tudo, sejamos fiéis no comprometimento com a igreja, com a comunidade local onde congregamos. Fiéis nas participações, nos horários, nos serviços, no sustento, na cooperação.
Muitas vezes esta fidelidade nos causará angústias. Quando isto acontecer, lembremo-nos deste momento de Jesus. Clamemos para que ele nos conforte e nos fortaleça neste dia para que não desistamos dos compromissos assumidos.
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